Direito Real de Habitação: Proteja a Moradia dos Seus Filhos — Especialmente se Tiverem Deficiência ou Alta Dependência
- aaobatista
- 2 de ago.
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Garantir o direito à moradia para filhos, especialmente os mais vulneráveis com deficiência ou neurodivergência, após a ausência dos pais, é uma preocupação legítima e recorrente no seio das famílias .
Uma das formas mais eficazes de assegurar o direito à moradia é por meio da concessão, ainda em vida, do Direito Real de Habitação sobre um imóvel. Esse instrumento jurídico permite que os pais garantam
a um filho, especialmente quando vulnerável, o direito de continuar residindo no imóvel familiar, mesmo após o falecimento dos responsáveis, desde que essa intenção seja formalizada por meio de escritura pública e devidamente registrada em cartório de registro de imóveis.
É importante distinguir dois regimes desse direito: o direito real de habitação legal e o convencional. O direito legal está previsto no artigo 1.831 do Código Civil, que confere automaticamente ao cônjuge ou companheiro sobrevivente o direito de continuar residindo no imóvel destinado à moradia da família, desde que esse bem seja o único de propriedade do casal. Já o direito real de habitação convencional é aquele constituído pela vontade das partes, com base na autonomia privada, podendo ser concedido a qualquer pessoa, inclusive filhos com deficiência, por escritura pública, com amparo no artigo 1.225, inciso VII, do Código Civil, que elenca os direitos reais, e no artigo 1.225 c/c 1.414, que trata da instituição voluntária desses direitos.
No caso de filhos com deficiência, essa modalidade convencional adquire especial relevância. Isso porque, ainda que o filho figure como herdeiro, nem sempre terá condições de defender sua moradia em uma eventual disputa entre sucessores. A dependência funcional, a fragilidade cognitiva e a instabilidade das redes de apoio tornam esse grupo especialmente vulnerável em contextos sucessórios. Assim, garantir previamente, de forma expressa e registrada, o direito real de habitação é um ato de cuidado responsável e juridicamente válido.
Além da proteção patrimonial, essa medida resguarda aspectos fundamentais da dignidade da pessoa humana — princípio estruturante do ordenamento jurídico brasileiro, previsto no artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal —, ao assegurar continuidade da rotina, estabilidade emocional e permanência no ambiente de referência para aquele que, por sua condição, pode vivenciar a mudança com maior sofrimento ou prejuízo funcional.
A formalização em cartório é essencial. O registro do direito no cartório de registro de imóveis confere publicidade, segurança jurídica e oponibilidade perante terceiros, evitando questionamentos futuros ou revogações arbitrárias. Ainda que o imóvel seja partilhado entre herdeiros, o titular do direito real de habitação manterá a posse direta sobre o bem, não podendo ser removido do local ou obrigado a partilhá-lo fisicamente.
Essa estratégia é especialmente recomendada quando: (i) a família possui apenas um imóvel destinado à moradia habitual; (ii) o filho beneficiário apresenta baixa autonomia e alta dependência; (iii) há receio de conflitos sucessórios ou ausência de uma rede de apoio sólida após a ausência dos pais.
Cabe destacar que o Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015), ao consagrar o modelo social da deficiência, reforça a importância de assegurar condições de moradia digna e estável, como forma de garantir não apenas a sobrevivência, mas a inclusão plena e efetiva na sociedade.
Portanto, proteger juridicamente o lar de um filho com deficiência é mais do que um planejamento sucessório: é um gesto de amor com efeitos concretos. É assegurar que, aconteça o que acontecer, ele continuará em um espaço que conhece, no qual se sente seguro, cercado por memórias, rotinas e vínculos afetivos. E quando o Direito se alia à sensibilidade humana, constrói-se um futuro mais justo, estável e digno para todos.



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